quinta-feira, novembro 29

Protoplaneta

Que é feito do ninho de andorinhas à porta do meu prédio?
Que é feito do cão que nos assustava todas as tardes quando voltávamos da escola?
Para onde foram levadas as flores amarelas que iluminavam o meu caminho para casa?
Quem levou o mato onde eu me embrenhava sem medo, sem receio?
De que será que o apicultor da área fugiu, deixando as suas abelhas sem acolhimento?
Porque foram esquecidos os passeios de bicicleta na descida da morte?
Quem foi o malfeitor que dizimou as pequenas hortas, esperançosas que se erguiam no meio das ruas?
O que é que impossibilitou a permanência das das crianças na rua a jogar futebol até não haver mais luz?
Em que dimensão residimos agora?
A humanidade progride (supostamente) a uma velodicade estonteante, e eu não consigo focar a mudança que nos rodeia. Tentam tapar-nos os olhos com marketing fútil, que pensa saber sempre o que é melhor para nós. Se calhar quem o puxou da direcção certa fomos nós.Sim...nós.
Porque o markeitng visa lucrar de acordo com as nossas necessidades, embelezando o seu produto - porque se tudo se julga pela capa e não qualidadade – elevando-o à categoria do indispensável.
E à medida que “progredimos”, novas necessidades vão sendo criadas, para que novos produtos ganhem novos compradores. Nós. Os tolos.
Enjaulamo-nos nas nossas masmorras de chips e de automatização, sem nunca pensar no que se passa lá fora.Estamos acorrentados pelo conforto e nem nos apercebemos disso. Os caprichos são mais importantes.
Trocamos os ingualáveis raios de sol, pela radiação dos ecrãs, a relva fofa cor de jade pelos sofás de polyester, as nêsperas pelos aperitivos cheios de conservantes, o contacto com outros pelas compras, pagamentos, inscrições e conversas on-line. E a cada dia que passa, o calor humano desce gradualmente...kelvin a kelvin.
E somos nós que estamos a congelar.
Não foi a idade do gelo há milhões de anos atrás? Acho que sim. Continuemos a “progredir” assim, talvez possamos reviver a era mesozóica.
Desnecessariamente deambulamos aos zigue zagues neste labirinto instável e não sabemos aonde vamos parar. E perguntam-se porquê.
Eu sei.

É tudo porque as andorinhas fugiram, o ar é irrespirável.

É tudo porque o dono do cão faleceu, indo a pobre criatura para um canil com o intuito de ser abatida. E o terreno onde morava dará lugar a mais casas empoleiradas umas nas outras.
É tudo porque as flores foram arrancadas para dar lugar a parques de estacionamento para bestas fumegantes .
É tudo porque o mato transformou-se num armazém de entulho.
É tudo porque não há condições para criar o mínimo de natureza possível, pobres abelhas sem direito de viver.

É tudo porque o “fixe” agora é andar num carro “quitado”, bicicletas são do século passado.
É tudo porque algum ganancioso quer urbanizar o mundo inteiro.
É tudo porque neste mundo comemo-nos uns aos outros. Corroemo-nos de inveja, maldade. Criam-se novos desejos de luxúria em nós, e já não é seguro haver confiar uns nos outros.
Vivemos na metrópole da perdição.
Numa sociedade em que a beleza das coisas simples é esquecida, a resposta para todas as perguntas complicadas sobre esta maldição rotineira e urbana, é tão simples quanto olhar para as estrelas.
Ainda somos neandertais.
Pelo menos sei que sou humana. Consigo ver a lua da minha janela, pregada num crepúsculo intenso em tons de azul e roxo.
Única como ela só.
E sinto borboletas esvoaçarem na minha barriga.

Sem comentários: